Eu andei lentamente pela
floresta coberta de neve. Meus arredores eram um panorama completamente cheio
de neve; os galhos das árvores coníferas que formavam esta bela floresta também
estavam cobertos de branco. Embora estivesse nevando, a luz do sol ainda estava
intensa. Este tipo de cenário seria raro em Alphine, mas eu já me acostumei com
isso agora, e sentia que conseguia andar mais rápido nas ruas cobertas de neve.
Minha habilidade de adaptação a mudanças nos arredores era bem alta por ter
precisado desenvolvê-la enquanto crescia.
No
início, eu senti um choque cultural, mas agora já havia me acostumado a viver
aqui até mais que Len, que já vive aqui há um bom tempo. Quando ele disse que
nunca saiu durante o inverno, parecia que ele estava falando a verdade. O dia
em que andamos nas ruas cobertas de neve pela primeira vez juntos ainda estava
fresco na minha memória. Sem conseguir se equilibrar muito bem, ele caiu
diversas vezes, e embora eu não estivesse mais acostumada a andar na neve que
ele, eu o puxei pela mão todas as vezes em que ele caiu. Quando eu me lembrei
da expressão chocada que ele fazia sempre que caía, não conseguia evitar sorrir.
Após tentar o que seria como “deslizar”, ele tentou várias formas diferentes de
andar, mas acabava caindo em todas elas. Ele era uma pessoa estranha; enquanto
era inocente e um pouco infantil, havia muitas vezes em que ele dava a
impressão de ser muito mais maduro e intelectual que eu era. E enquanto
continuava mantendo essa aparência, sua personalidade escondia um charme
estranho que ganhava afeição tanto das empregadas quanto das pessoas das
cidades próximas.
Eu
esperava que ele fosse voltar logo para casa... Desde anteontem, Len foi à
capital. Supostamente, era a trabalho relacionado às terras por aqui, e alguns
negócios pessoais. Ele trabalhava como um nobre que governava estas terras, mas
já que não interagia com muitos nobres com frequência, ele praticamente
encontrava apenas os aldeões a trabalho.
—
Hum, com licença...
A
construção que eu espiei estava vazia. Geralmente, as freiras ficam por aqui.
Elas saíram agora? Ainda era um pouco cedo para ser chamado de noite. Iluminada
por inúmeras velas, a sala dava uma atmosfera de sonho. Eu me
aproximei do altar, me ajoelhei, e juntei minhas mãos. Desde
muito antes, o tempo que eu passava com Deus sempre acalmava meu coração. De
repente, eu ouvi o som da porta se abrindo atrás de mim. Alguma das freiras
voltaram?
—
Irmã?
Eu
não conseguia ver muito bem de onde eu estava por casa da luz lá fora brilhando
atrás. Não houve resposta, então talvez seja um dos aldeões que vieram rezar. Eu
tentei me aproximar um pouco, e quando o fiz, a figura que estava apoiada
contra a porta veio ao meu encontro, e bateu um par de asas enormes.
Asas...
Completamente brancas, com uma aparência de dignidade... era um anjo. Eu estava
tão chocada que não conseguia falar.
—
...Você terminou suas preces?
Sua
voz baixa ecoou no teto alto. Meu corpo inteiro ficou paralisado diante desta
conduta digna.
—
...Um... um anjo...?
—
Correto. Entretanto, não há por que ficar alarmada. Há um próximo de você, não
é?
—
Hã...?!
Eu
não conseguia acreditar no que estava ouvindo. Eu nunca havia visto um anjo
antes. Já que meu pai costumava contar histórias sobre anjos e demônios na hora
de dormir, eu tinha uma grande fé em Deus, mas nunca havia O visto antes. Ainda
assim, da forma que ele estava dizendo, um anjo esteve sempre em algum lugar
próximo a mim. Era o que parecia. Sem conseguir entender, eu só conseguia
encarar esta presença opressora.
—
...Você não se lembra? Bem, não importa. Eu tenho algo mais importante para lhe
dizer.
Com
isto, o anjo parou em seus pensamentos, com suas sobrancelhas curvas em
desprazer, como se estivesse batalhando para encontrar as palavras certas. O
que ele poderia ter para me dizer? Mas, se um anjo aparecesse e dissesse que
tem algo importante a passar, eu só conseguia pensar um uma coisa. Um oráculo.
Especialmente para aqueles próximos da morte.
—
...Hum... Eu... Eu sinto muito!
Confusa,
estas foram as primeiras palavras em que pensei. Eu não poderia esconder nada
diante de um anjo, os mensageiros de Deus.
—
Eu... até agora, fiz muitas coisas erradas. Eu traí minha cidade natal, minha
mãe e meu noivo... Tudo por minha própria felicidade, eu fui egoísta e dei as
costas a tantas coisas!
—
...É mesmo? Humanos são criaturas cheias de ganância. É de sua natureza
abandonar e trair os outros por seus próprios desejos. Você não é a única.
—
Mas...
—
Ouça. Eu não vim fazê-la se arrepender.
—
Hã?
Aumentando
o franzir de suas sobrancelhas, o anjo continuou, como se houvesse decidido.
—
Neste ritmo, você não poderá ser salva. O mesmo vale para ele. O Paraíso não
pode perdoá-lo; eles não irão fazer vista grossa para suas ações.
—
...!
Quem
ele queria dizer com “ele”? Mas... se eu pensasse em alguém que não poderia ser
perdoado, só havia uma pessoa que surgia em minha mente.
—
Len! Ele... O Len vai ser punido pelo Paraíso?
—
...Tsk. Sim... As coisas que ele fez também são um tabu imperdoável. Não há
como escapar disso.
—
Não... não pode ser...
—
Mas, só tem uma forma. Uma forma que tanto ele quanto você podem ser salvos.
—
Por favor! E-eu farei qualquer coisa! Não importa quanto sofrimento seja...
Então, por favor, me diga.
—
Entendo. Então irei lhe dizer... Esqueça sobre ele e volte para sua própria
casa.
—
...O quê?
—
Ainda há tempo. Antes que eles descubram que ele ainda está vivo nestas terras,
acabe com toda evidência e volte as coisas a como eram antes. Se você fizer
isso, você também poderá manter sua vida.
—
O que... quer dizer?
Eu
não conseguia entender o que o anjo estava dizendo. Fazer as coisas voltarem a
ser como antes? Mas para onde? O pecado de trair tudo e escapar — era um crime
punido com a morte no Paraíso? Ou ele cometeu um pecado ainda maior antes de
nos conhecermos?
—
O simples fato de vocês dois estarem juntos é um tabu. Por isso estou dizendo para
destruir todas as evidências, antes que o crime seja julgado. Entende agora?
—
O tempo é limitado. Enquanto você está parada aí, eles podem descobrir, e tudo
será perdido.
O
anjo estava olhando para mim com um pouco de irritação agora. O que ele queria
dizer com o tempo ser limitado? Eu tentei organizar os pensamentos em minha mente
agitada. Este anjo iria levar Len para o Paraíso por seus pecados. Isso
significa que ele seria salvo, quando deveria ir para o Inferno? Mas isso
significaria que eu seria a única salva — a única que ainda
estaria na Terra. Mesmo que... mesmo que ambos tenhamos a culpa.
—
Eu... Eu me recuso...!
—
O que você disse...?
—
Por favor... Por favor, não leve o Len! Eu imploro... eu também sou culpada! Se
ele será punido, então puna nós dois!
Eu
barganhei com minha cabeça curvada para baixo. Eu não me importava com o que
acontecesse comigo. Se eu pudesse estar com o Len... Se pudéssemos continuar
juntos, qualquer punição, não importa o quão cruel, seria tolerável.
—
Eu... Se eu o perder... Então eu não terei nada!
—
...!
—
Ele... me mostrou a liberdade. Naquele dia... ele foi quem permitiu que eu
renascesse. Graças a ele, eu pude ver como a vida é agradável... Se ele partir,
então eu... eu não tenho motivo para viver!
Ele
me encarou profundamente. Era imaginação minha, ou uma sombra de tristeza
passou por seus olhos?
—
...Você não entende nada. Você acha... que ele deseja o mesmo? De verdade?
—
...!
Em
um segundo, meu coração se abalou. É verdade. O que o Len iria querer? Como o
anjo disse, se nos separássemos, poderíamos salvar um ao outro... e evitar
qualquer punição. Não é natural acreditar nas palavras de um anjo, o mensageiro
de Deus? Se Len estivesse aqui agora, o que ele diria? Mas, mesmo assim, eu...
—
Ainda assim, eu não quero me separar dele. Porque...
Eu
tentei me lembrar — o pouco tempo que passei com ele. Desde vir para Tard, todos
momentos cheios de um calor gentil.
“Se você ficar para sempre ao meu lado, isso
é o bastante. Eu não preciso de mais nada.”
Essas
foram as palavras que ele disse; elas significavam muito para mim. E eu também
sentiria o mesmo, para sempre.
—
Porque eu o amo.
—
...!
—
E ele também... Ele também me ama, do fundo de seu coração. Mesmo sem
perguntar, eu sei disso.
Que
coisa espantosa, ir contra o mensageiro de Deus... Mesmo com todo o seu esforço
de vir e nos dizer uma forma para sermos salvos... Eu estava com tanto medo que
minhas pernas estavam tremendo. Mesmo assim, se ele continuar ao meu lado... Sorrindo,
o anjo fez uma expressão de quem está profundamente ferido.
—
Neste caso, eu não tenho escolha... Por este pecado, devo fazê-la compensar com
sua própria vida.
—
Ah...
Bang—
Eu
ouvi o som seco de um disparo. Meus arredores lentamente ficaram distorcidos e
afundavam em câmera lenta. Não, era eu que estava afundando...
˚ ˚ ˚ ˚ ˚
Agora
era o fim da tarde. Eu disse que retornaria à noite, mas pensando em vê-la o
mais rápido possível, eu apressei meus passos. Já fazia um tempo que eu fui
para a capital, e após terminar rapidamente meu trabalho na área urbana, andei
pela cidade, indo de uma joalheria para a próxima. No dia anterior, quando eu secretamente
consultei Lily, ela educadamente me disse o tamanho do anel da Miku e
preferências. Era em momentos como esse que eu queria expressar minha profunda gratidão
por seu talento. Eu tentei procurar um anel belo e elegante que combinaria com
a mão linda e suave da Miku.
Após
uma longa procura, a última loja que eu fui tinha uma atmosfera antiga.
Enquanto olhava a vitrine sem muitas expectativas, eu encontrei exatamente o
que estava procurando, e alegremente fiz a compra. A dona da loja deve ter se
encantado com o sorriso que eu tinha no rosto a todo o momento, e enquanto embrulhava
o anel, me perguntou cada detalhe sobre a pessoa para quem eu iria dá-lo.
—
Que sortuda ela é, receber um anel de um namorado tão amável. É um anel de
noivado?
Ouvindo
algo assim, eu descaradamente disse que eu era o sortudo, e embora tenha acabado
de conhecer a dona da loja, acabei me gabando da relação entre Miku e eu, A
dona da loja gentilmente me disse para voltar novamente quando quisesse, e eu
deixei a loja de bom humor.
—
Ah, mestre Len, bem-vindo!
—
Olá, Lily.
Quando
eu tirei meu casaco e tirei a neve dele na entrada, Lily logo veio me
cumprimentar.
—
...E então! Conseguiu encontrar? O item necessário!
—
E daí? Você vai dar a ela de qualquer forma, não é? Então eu não vejo o problema.
—
É verdade, mas... Ah, falando nisso, onde está
a Miku?
Eu
queria mostrar logo o anel para ela e que ela usasse. Na verdade, eu também
pratiquei como fazer o pedido quando consultei Lily antes, então eu estava
completamente preparado.
—
...Ah! Pensando nisso, a Miku não voltou desde que foi para a igreja esta
tarde.
—
Hã?
—
Vocês dois sempre vão à igreja no domingo, correto? Mas hoje, ela foi sozinha.
—
Entendo... Mas já está tarde agora.
O
sol já estava se pondo. Talvez eu possa tirar vantagem desta oportunidade e dar
o anel a ela na igreja — seria um clima ótimo.
—
Eu vou procurá-la.
—
Minha nossa, mas você acabou de chegar.
Eu
coloquei meu casaco novamente, e rapidamente me aprontei.
—
Por favor, voltem a tempo do jantar! Tenha cuidado!
Eu
me despedi de Lily e rapidamente segui o caminho coberto de neve que dava até a
floresta. Eu tive que correr para chegarmos de volta à mansão antes da noite.
Ela ficaria feliz de receber este anel e ouvir meu pedido? Ainda animado e em
um ritmo mais rápido que antes, eu fui até a igreja onde a Miku estava.
Tudo
o que eu pude ouvir era o som da neve sob meus pés. A neve continuava a cair em
uma velocidade estável, apagando minhas pegadas tão rapidamente quanto eram
feitas. E então, de repente, embora não houvesse mais ninguém na floresta além
de mim, eu senti um desconforto. No meio do panorama nevado, toda a energia fluía
em silêncio. Por isso eu era capaz de sentir as menores presenças ou mudanças
no fluxo mais apuradamente que o normal. Mesmo que meus sentidos tenham diminuído
grandemente desde que renasci como humano, eu sabia imediatamente quando seres
com presenças fortes, como anjos ou demônios, estavam próximos.
—
...Quem está aí?
Eu
me virei para olhar para o caminho pelo qual vim, encarando as árvores. Eu não
conseguia ver ninguém. Mas, eu já senti essa presença antes. Fiquei em
silêncio, sem fazer o mínimo barulho.
—
Ah! Parece que meu disfarce está arruinado. Sua intuição está bem melhor que
antes, não é?
Dizendo
isto, o demônio de cabelos vermelhos que eu havia confrontado antes surgiu das
sombras de uma árvore. Todos os músculos de minhas costas se tensionaram.
—
Relaxe. Eu não vou fazer nada.
—
...
—
Por outro lado, você mudou muito desde a última vez que a vi.
—
...
—
Antes, eu nunca imaginava que você se tornaria um humano... e um homem, além
disso. Ah, mas você era um anjo tão fofo! Que desperdício!
—
Era só isso que você queria dizer?
—
Hm? Isto é incomum. Quando eu a provocava antes, você ficava esquentadinha e
falava “quieto!” ou “cale-se!”. Em termos de personalidade, você parece ter
ficado mais madura, hm?
O
demônio falou na mesma maneira de sempre, e lentamente se aproximou de mim
enquanto falava. Ele disse que não faria nada, então continuei parado.
—
Oh? Então você não vai correr?
—
Você disse que não faria nada. Além disso, você está interessado pela Rin, não
é? Não por mim.
—
...Hah. Você arruína o clima, francamente... Eu não tenho interesse em caras,
mas já que seu rosto ainda é exatamente o mesmo da jovem Rin... Bem, acho que é
óbvio. Falando nisso...
Eu
fiz contato visual com o demônio que andou até mim. Seus lábios formavam um
sorriso relaxado.
—
Há algo que eu queria perguntar. Eu pensei em perguntar após aquele dia, mas
você desapareceu. Foi um problema te localizar, sabia? A velha foi teimosa e
não queria me falar, também, então não tive escolha senão seguir aquele anjo
carrancudo, e quando eu fiz isso... Bingo!
Por
“anjo carrancudo”, ele deve estar falando do Kaito. Conseguir seguir o Kaito
sem ser notado, parece que ele não era um demônio qualquer, afinal. O demônio
lentamente estendeu sua mão, e tocou minha orelha esquerda com uma grande unha.
—
...Não tenho a obrigação de dizer.
—
Ah, vamos... Eu que a ajudei a cair, hm? Por que não pode me dizer, hã? Ou... É
porque você tem algo a esconder?
—
...
O
demônio pegou algo de seu bolso e estendeu para mim. Era um brinco pequeno no
formato de uma cruz. O mesmo que eu usava em minha orelha esquerda agora. Sim,
era—
—
...! On-onde você conseguiu isso?!
—
Hmm... Não vou dizer.
—
O quê?1
—
Afinal, você também não me disse. Estamos quites.
—
...Tsk. Certo. Eu digo. Foi... dado por um anjo que era meu parceiro. Eu usava
na orelha direita... mas agora coloquei na esquerda. Porque ouvi que a maioria
dos homens humanos usam brincos na orelha esquerda.
—Oh!
Entendo... Então, deixe-me perguntar outra coisa. Esse anjo... Onde ele está
agora?
—
Eu... não sei.
—
Hmmm.
—
E então? Por que você tem um brinco
exatamente como o meu?!
—
...Eu recebi o meu quando era um demônio minúsculo... Do anjo que você
mencionou. Embora já tenha se passado trezentos anos.
—
?
Quando
eu “o” encontrei, desde a primeira vez que fomos parceiros, ele sempre usava apenas
um brinco. Então, isso significa que há muito tempo, antes mesmo que eu
nascesse, este demônio recebeu o outro brinco dele?
—
Então isso significa que nós dois recebemos um lado do mesmo par de brincos do
mesmo cara, hã?
—
Por que ele lhe deu isso? Estes brincos são difíceis de conseguir mesmo para
anjos seniores. É algo que só é dado para aqueles com conquistas especiais no
Paraíso! Então, por que você tem isso? Qual a sua ligação com ele?! Não me
diga... foi você que...
—
...Você não mudou nada, não é? Você fica esquentadinha tão fácil!
No
dia em que “ele” abandonou o Paraíso, sua presença não foi encontrada no mundo
humano. Mesmo no período em que eu procurei com os outros anjos, não conseguimos
encontrar nenhuma pista. E, este demônio... Se este demônio soubesse o segredo
por trás da queda dele, então...
—
Eu pensei que finalmente havia conseguido algumas pistas, mas... parece que
estou de volta à estaca zero, hã? Francamente, eu vou ficar cansado de andar em
círculos... Me pergunto se ele já morreu.
—
O quê? Por que você está procurando “ele”? Você é um demônio, não é?
—
Eu disse antes, não é? Não me importo se é um anjo, ou demônio ou humano ou o
que for. Eu só tenho algo que quero dizer a ele...
—
Algo... que você quer dizer a ele?
—
Você deve saber o que está acontecendo recentemente pelos jornais ou alguma
outra fonte, não é? Vai começar em breve... A Guerra do Paraíso.
—
...! Você quer dizer—
—
Opa, você não vai ouvir mais de mim. E, de qualquer forma, isto não tem nada a
ver com você, um humano, não é? Quero dizer, o que acontece entre anjos e
demônios.
Com
um bater de asas, o demônio voou. A neve que estava empilhando em suas asas
negras caiu facilmente.
O
demônio mencionou uma guerra. Em outras palavras, os demônios que aumentaram
seu poder através da fé neles devem ter conseguido pensar em um plano em grande
escala. Usando Honestidade, sua técnica de lavagem cerebral, eles estavam ganhando
poder de devotos e humanos fortes. Ultimamente, eu notei que as notícias dos danos
até aqui em Tard aumentam a cada dia, mas não imaginava que a situação havia
ficado tão séria.
Eu
tinha que avisar a Kaito o mais rápido possível.
Houve
um baque quando a neve caiu de uma árvore próxima. Meus pensamentos confusos
voltaram à realidade com o som. Exatamente; agora, eu era Len, o humano. Não
Rin, o anjo. Eu não possuía mais o poder de lutar como um deles. Apenas agora
eu percebi que os demônios estavam continuando a reservar poderes demoníacos
manipulando os humanos com Honestidade. Todo esse tempo, eu estive apenas me
enganando, dizendo que não tinha nada a ver comigo porque eu era um humano,
porque não podia lutar.
Depois
que fiquei atordoado por um tempo, finalmente me acalmei e voltei aos meus
sentidos. O que eu precisava recuperar agora era minha amada, que estava demorando
a voltar para casa.
E,
de qualquer forma, Kaito com certeza me veria de novo. Eu contaria a informação
que ouvi do demônio ruivo nessa hora. E sobre “ele”, também. Kaito me disse que
manteria minha vida em segredo daqueles no Paraíso, mas era apenas uma questão
de tempo até que descobrissem. Por isso eu queria fazer o que pudesse por ela
agora. Eu apertei a caixa que deixei em meu bolso esquerdo. Como ela reagiria
quando eu lhe desse o que estava nesta caixa e dissesse as palavras? Ela
ficaria feliz? Agora, eu viveria penando apenas nestas coisas.
A
silenciosa capela era iluminada pelo brilho de numerosas velas, e embora o sol
estivesse se pondo, aqui estava claro como o dia. As flores que belamente decoravam
o altar eram brancas cristalinas, como a neve lá fora. Qual era esta flor? Eu
não conseguia lembrar o nome. Eu sentia que alguém havia me dito que era uma
flor muito rara.
Lentamente,
eu me movi para a frente, um passo de cada vez. Eu estava com medo, e não conseguia
mover minhas pernas muito bem. Eu já havia me acostumado a andar com estas
pernas humanas, mas nestes momentos cruciais, meu corpo não funcionava.
Eu
lentamente andei para o lado dela, e finalmente cheguei. A caminhada foi excruciantemente
longa, fazendo um segundo parecerem dez minutos ou até mesmo uma hora. Com uma
flor profundamente vermelha no lado esquerdo de seu peito, ela estava paralisada.
Seu rosto estava pacífico, como se ela estivesse dormindo. Eu aproximei seu
corpo do meu.
—
Miku...
Não
houve resposta. E não haveria uma. Seu coração já havia parado há muito tempo.
—
Miku... estou implorando... Por favor... abra os olhos...
Eu
sussurrei em seu ouvido, mesmo que ela não conseguisse ouvir. Quando eu era um
anjo, estava acostumado a ver em meus trabalhos os humanos gravados na Lista de
Ascensão e a guiar suas almas ao Paraíso. Nestes momentos, aqueles que estavam
em luto que eram deixados para trás geralmente ficavam ao lado da pessoa que
havia morrido. Eu já estive nesta situação diversas vezes, e já deveria estar
acostumado a isso. Mas, as emoções que tinha em meu peito agora eram incomparáveis
a qualquer memória do passado, me tomando de desespero, ira e tristeza.
—
É tudo... minha culpa... Tudo isso.
Naquele
dia, se eu não tivesse ido ao casamento dela, fingindo ser uma coincidência. Se
eu não me segurasse a essa pequena esperança, e não tivesse a encontrado...
Talvez as coisas não teriam terminado assim. Eu senti que seria esmagado pela
culpa e erros que não poderia consertar. Eu deveria saber. Desde o dia em que
encontrei Kaito de novo. Não, até mesmo antes disso — desde que me tornei um
Anjo Caído, e decidi viver minha vida como um humano. Tudo isto aconteceu por
causa de meu desejo egoísta.
Eu
queria me tornar humano. Me tornar um humano e viver com ela. Eu queria
satisfazer a tristeza dela com o meu amor. E então, talvez, se ela pudesse me
amar também... Era só o que eu desejava.
Para
isso, eu deixei tantas coisas insubstituíveis de lado. Meus gentis colegas, meu
superior cuidadoso, minha missão de orgulho como um anjo e eu mesma. Eu passei tantas
noites em claro me arrependendo de tudo o que havia abandonado, mas todas as
vezes, eu era confortado pelo sorriso dela. Não importa quão terrível eu me
sentisse à noite, quando a manhã chegasse e eu visse seu sorriso, poderia me
animar. Se ela estivesse ao meu lado — estes sentimentos que eu transmiti a ela
em tantas ocasiões não foram mentiras.
—
Tudo o que eu lhe disse aquele dia era verdade.
Embora
eu ache que você não se lembra mais. Quando eu ainda era Rin, eu fiz uma
promessa para você no dia em que revelei minhas verdadeiras intenções pela
primeira vez. Eu fiz os votos para sempre estar ao seu lado e protegê-la.
Embora você deva ter achado que era apenas uma benção angelical ou algo assim.
Eu fiz meus votos... Ao ponto de me rebelar contra Deus.
—
Por isso, eu vou protegê-la.
Eu
cortaria meu contrato com as trevas e liberaria meus poderes de anjo novamente.
Murmurando
o feitiço para finalizar o contrato, as trevas desapareceram, e a energia
sagrada suprimida tomou meu corpo. A lei do Paraíso dizia que uma pessoa que
cometeu um pecado poderia ser punida por ele apenas uma vez. Se esta era a “punição”
que ela recebei, então sua vida não poderia mais ser um alvo daqueles no
Paraíso. Eu não tinha escolha senão acreditar nisto.
—
...Eu vou acordá-la agora, aguente um pouco mais...
Eu
lentamente a levantei e a trouxe aos meus lábios. Usando todo o meu poder
sagrado como anjo, eu traria sua alma de volta. De todos os tabus, reviver os
mortos era o maior crime. O preço que eu pagaria seria minha própria alma.
Suas
memórias já foram perdidas como compensação para meu contrato com o demônio.
Mais que tudo, eu temia que ela pudesse me odiar quando suas memórias
retornassem, e que ela soubesse de tudo o que eu fiz.
˚ ˚ ˚ ˚ ˚
Quando
voltei a mim, tudo ao meu redor estava envolto em uma luz ofuscante.
O
que aconteceu comigo? Se me lembro bem, eu encontrei um anjo de cabelos
azuis...
Nós
conversamos.
Eu
recusei seu conselho.
E
ele ficou com raiva, e pegou uma arma...
Aquilo
foi um sonho...?
Com
minha visão ainda nublada, lentamente abri minhas pálpebras pesadas. Diante de
mim, sorrindo gentilmente estava...
—
Bom dia.
Eu
já havia visto o seu sorriso em algum lugar antes.
Esta
sensação, que eu não sentia há muito tempo... Por algum motivo, não parecia ter
sido há muito tempo. É porque...
Sim.
É claro. Esta garota era...
—
Você estava dormindo tão pesado, pensei que você nunca acordaria.
—
Ri... n...?
—
...
—
Rin... É você, Rin...?
—
...Sinto muito por enganá-la por todo esse tempo. Parece que suas memórias voltaram.
Você está bem?
Minha
cabeça estava girando, como se estivesse sendo engolida por uma corrente. Os
fragmentos de memórias que eu havia esquecido estavam voltando. As preciosas
memórias de todos os dias alegres que eu passei com ela — com Rin. Por que eu
esqueci essas memórias preciosas até agora? Eu deveria ter notado quando o
encontrei... Len, que era exatamente igual a Rin.
No
dia do meu casamento, Rin se tornou Len e veio me salvar... Por que eu não
percebi até agora? Naquele dia, quando Rin me confortou quando eu chorei,
prometendo que sempre estaria ao meu lado para me proteger — como eu só pude
perceber agora que ela estava mantendo esta promessa por todo esse tempo?
Quando
olhei para meu corpo, vi que havia traços de sangue aqui e ali. Então não foi
um sonho; eu realmente fui baleada por aquele anjo. — Sim, eu tenho certeza que
fui baleada. Então, por que eu estava aqui agora, como se nada tivesse
acontecido?
—
Eu tenho que ir agora.
—
Hã...?
—
Miku...
Eu
fui envolta em um aroma gentil e familiar. Rin estava me abraçando com tanta
força que doía.
—
Sou muito feliz por tê-la conhecido, Miku.
—
Rin...
—
Eu sou muito feliz... por poder tê-la amado.
—
...? Eu... também te amo, Rin... hum, Len...?
—
Ha ha. Não importa como você me chamar. Porque eu não vou mudar... Mesmo que
minha aparência mude, meus sentimentos continuarão sempre os mesmos...
—
...! Eu... eu sinto o mesmo. Se Rin for Len, ou Len for Rin… eu ainda te amo da
mesma forma.
—
Miku... Eu sou muito feliz. Me sinto salva por essas palavras...
—
Rin...
—
Obrigada por tudo. Eu te amo.
—
Ah!
Ela
estava ficando transparente. Enquanto emitia um fraco brilho, seu corpo...
estava desaparecendo.
—
Não... não pode ser... Rin!
—
Com
suas palavras finais, a luz desapareceu.
—
Rin?
Não
importa o quanto eu chamasse, não havia uma resposta.
—
Rin? Len!
Foi
então que eu vi algo pelo canto de meus olhos. No lugar onde ela estava alguns
momentos antes, havia uma única pena negra e uma caixa pequena.
—
Uma pena...? Uma pena... negra?
As
penas dos anjos deveriam ser brancas. As de Rin também eram um belo branco. Eu
tenho certeza... Então por que havia uma pena preta aqui...?
Eu
lentamente estendi minha mão até a caixa e a abri. Dentro, havia um belo anel
com uma flor branca. Era o mesmo modelo do que ela conseguiu para mim naquela vez
na tenda de tiro ao alvo à distância. No interior do anel havia uma frase. Eram
palavras de amor.
“Sempre... Agora e para a eternidade, eu
estarei ao seu lado para protegê-la.”
Sempre...
De fato, sempre, mesmo quando eu esqueci, você esteva lá para mim, Rin.
“Se você ficar para sempre ao meu lado, isso
é o bastante. Eu não preciso de mais nada.”
Era
o mesmo para mim... Len. Eu fui muito feliz por estar com você... eu não
precisava de mais nada... nada mesmo...
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