segunda-feira, 22 de abril de 2019

Himitsu ~Kuro no Chikai~ [Capítulo 2, Parte 4 - O contrato]

gentil luz do sol iluminou um único galho da Árvore da Vida. Como uma fonte de energia sagrada, os anjos frequentemente descansavam aqui. Rin se alongou em um alho pequeno nas sombras, descansando um pouco. Ultimamente, estavam bem ocupados no Paraíso.
Já fazia um ano desde que a investigação sobre fé em demônios começou na Região de Velcant. Incapaz de encontrar alguma informação útil até agora, as unidades postas na missão continuaram a vigiar sem para o mundo humano diariamente. Em particular, a unidade de Kaito, que tinha Velcant sob sua guarda, era a mais agitada.

Embora ela soubesse que teria que se afastar da investigação hoje de novo, por algum motivo, ela não conseguia encontrar a motivação. Já estava assim há um tempo. Não importa o que fizesse, ela acabava se distraindo e olhando para o céu, e preocupando Kaito e os outros membros de sua unidade, e até mesmo a equipe mais despreocupada do Paraíso, Gaku e Gumi. Contudo, em um momento desses, a intuição deles era bem afiada, de alguma forma, e eles imaginaram que ela tinha comido algo estranho quando estava no mundo humano. Entretanto, incapaz de imaginar o motivo real, eles só conseguiam se preocupar de longe.
— Hah... Miku...
Ela soltou um longo suspiro e, mais uma vez, os mesmos pensamentos se repetiram. Agora, a maioria de seus pensamentos eram sobre a Miku. Desde aquele dia, ela percebeu que o rosto de Miku continuava piscando em sua mente. Ela estava interessada nela há um tempo; uma humana que ela gostava tanto que conseguia um tempo para se encontrar com ela no mundo humano. Mesmo assim, ela nunca pensava tanto em Miku que não conseguisse trabalhar, como o que estava acontecendo hoje.
Desde o dia em que a beijou, ela sentia que algo mudara dentro dela. Como eu vou encarar a Miku agora? Na próxima vez que nos encontrarmos, o que devo dizer...? Em primeiro lugar, sua personalidade despreocupada e que não pensava muito a fundo nas coisas trabalhava contra ela; ela tinha o hábito de se preocupar infinitamente após começar. A última vez que ela se preocupou tanto foi quando se separou “dele” — seu parceiro anterior, há vinte anos.
— Rin!
Assim que estava se perdendo em pensamentos de novo, ouviu alguém chamá-la abaixo. Voltando à realidade, ela olhou para baixo e viu um anjo carregando uma grande tesoura vermelha e um regador, piscando maliciosamente, a cuidadora desta árvore, Meiko.
— Você apareceu em uma ótima hora! Eu precisarei de ajuda aqui embaixo. Poderia me ajudar a podar?
— Não é sempre que a vejo por aqui. De verdade, já faz muito tempo.
— Ahahaha... É verdade. Já que agora estamos em divisões diferentes agora.
Segurando uma tesoura que tinha quase o dobro de seu tamanho, Rin cortou o galho da macieira. Normalmente, seriam os anjos designados sob Gabriel que eram especializados em cuidar desta árvore, então ela não sabia onde e como deveria cortar. Ela apenas podava as áreas que Meiko apontava.
— Como você tem estado? Ouvi que você foi promovida a anjo júnior. Se me lembro bem, você foi posta... na unidade do Kaito, não é
Meiko disse enquanto habilmente movia o regador para regar as plantas. Ela ajudou muito Rin quando ela ainda era um anjo em treinamento. Como uma das melhores cultivadoras de maçã do Paraíso, ela ensinou Rin sobre o básico de cultivação de maçãs. Enquanto no mundo humano, elas tiveram uma relação de professora e aluna. Meiko, que também era um arcanjo como Kaito, a tratava bem, mas assim que Rin oficialmente se tornou um anjo júnior e ficou ocupada com o trabalho, elas não se encontravam muito. Sendo de unidades diferentes, não era sempre que elas precisavam trabalhar juntas.
— Estou fazendo uma investigação no mundo humano como parte da unidade de Kaito.
— Entendo! Ele é do tipo de pessoa que é rígido consigo mesmo e com os outros, então deve ser cansativo, não é? Você já se acostumou ao trabalho?
— Sim! Eu trabalho como par do Kaito há um tempo, então... estou em ótima forma!
— ...De certa forma, você parece um pouco cabisbaixa. Aconteceu algo?
Rin ficou surpresa quando foi perguntada isso. A voz de Meiko parecia preocupada, mas gentil. Embora ela tenha tentado parecer animada, Meiko viu através de tudo. Talvez por se conhecerem há muito tempo, ela sempre conseguia descobrir quais segredos ela estava guardando facilmente, não importa quão triviais.
— ...
— Você não precisa me contar se não quiser. Só estou um pouco preocupada. Quando a encontrei mais cedo, a expressão que você tinha... era a mesma de antes, é só isso...
Antes. Quando ele caiu, Meiko estava lá para apoiá-la também.
— Ei... Você... Você tem interesse por humanos, Meiko?
— ...?
— Desculpe! Isso foi muito repentino... É que, ultimamente, eu tenho ido ao mundo humano com frequência para trabalhar... E, bem, tive oportunidades de falar com humanos, e... Sim.
— Bem... falando da minha “posição”, humanos são uma existência frágil que precisa que fiquemos vigiando-os. Do momento em que nascem até o momento em que morrem, observá-los... esta é a missão daqueles que protegem esta árvore.
A árvore da Vida, A Grande Árvore. Esta única árvore, uma enorme macieira que parecia quase formar uma floresta inteira, era constantemente protegida e cuidada por anjos de Gabriel.
A Árvore da Vida mantém a circulação da vida, e é, por assim dizer, a forma temporária de Deus. Os galhos produziam frutos da alma, a maioria dos quais caem na Terra e se tornam a alma de humanos.
Entretanto, raramente, há maçãs que se diferem das normais maçãs da alma, que brilham notavelmente e se tornam frutos. Estes frutos não caem até a terra, e destes, nascem os anjos.
Além disso, quando um humano ou anjo morre, sua alma retorna à esta árvore através das raízes, e renasce como uma nova vida. Nada é certo neste ciclo de circulação de almas; tudo acontece por acaso. Uma vida perdida hoje pode nascer novamente em algum outro lugar no dia seguinte. Ou pode continuar dormindo indefinidamente dentro da calorosa árvore até que o momento chegue. Anjos meramente provém assistência mínima para se certificarem que este ciclo não seja adiado.
Exato, simplesmente observando e nada mais.
— Mas, eu penso comigo mesma às vezes. E se...
Enquanto sorria gentilmente, Meiko tocou o tronco da árvore, como se tivesse pena dela.
— E se, mesmo que parássemos de cuidar desta árvore, ela... Humanos ainda nascessem, como agora, e morressem, como agora?
— ...
— E se os humanos não são tão fracos quanto acreditamos que sejam? ...Ou melhor, mesmo sendo frágeis e simples... e vivendo vidas tão breves comparadas às nossas, eles brilham e fazem o melhor que podem... E se eles são muito mais fortes que nós, anjos? ...Guarde o que eu disse como segredo dos outros, tudo bem?
Seria uma fala controversa vinda de um arcanjo encarregado de cuidar desta árvore. No Paraíso, era sempre pensado que, sem a ajuda dos anjos, os humanos não conseguiriam viver ou morrer corretamente. Era um problema lidar com o significado da existência dos anjos.
— Certo... Meiko, você já pensou em manter contato com humanos?
— Hum... Já que eu passo todos os dias com as “almas” deles assim, eu não ousaria ir ao mundo humano e manter contato com os “receptáculos”. Acredito que já esteja em contato suficiente agora.
— Entendo...
— Você está interessada em algum humano em particular, Rin?
— Hã... H-Hum...
Rin, que estava quebrando a lei ao interagir com humanos mais que o necessário, repentinamente ficou embaraçada.
— Huhu. Não precisa esconder. Eu não direi a ninguém. E, de qualquer forma... você não é a única.
— Hã...?
— Você não é o único anjo que mostrou mais interesse do que devia pelos humanos... Desde muito tempo atrás, há muitos anjos que pensam da mesma forma.
— Mes-mesmo...?
— ...Isso também é algo que é mantido como segredo dos mais novos, mas...
“Mais novos” significava os anjos com menos de trezentos anos de idade.
— Antes, tanto o Paraíso quanto o mundo humano estavam em muita desordem. A distância entre os anjos e os humanos costumava ser menor, e as leis não eram tão rígidas como agora. Isso é, antes da Grande Guerra acontecer...
— ...!
— Você já ouviu falar do “Anjo Lendário”?
— Hum... Aquela que teve um papel bem ativo na Grande Guerra?
No templo Gran Dios, durante a época do Oráculo, um grande e dourado retrato de uma mulher decorava aquele lugar sagrado. Ela foi a salvadora da guerra há quinhentos anos, com força invencível. Todos os anjos aspiravam ser como ela em algum ponto de suas vidas.
— Sim, o Lendário e Dourado Anjo. Sabe... Até mesmo ela caiu à terra por conta própria.
— !!
— Surpresa...? Até mesmo ela, que é dita como sendo a Escritura Sagrada dos Anjos. Por isso não é algo tão anormal anjos estarem interessados em humanos. Não acha? Afinal, eles são as “vidas” que nos arriscamos as nossas para proteger. Ah... Guarde tudo o que eu disse como segredo dos outros, tudo bem?
O coração dela estava batendo acelerado há um tempo. Rin assentiu vigorosamente, jurando absolutamente guardar segredo. Meiko aproximou um dedo de seu lábio enquanto ria; devia ser apenas a imaginação de Rin, mas seus olhos pareciam ter um brilho de solidão.

Desde que consultou Meiko sobre os humanos... em outras palavras, sobre sua ambiguidade com Miku, Rin ainda não havia feito muito progresso com seus sentimentos. Embora ela estivesse aliviada em descobrir que estar interessada em humanos não era algo negativo, isso era exatamente o que a deixava mal, como um anjo, por não conseguir parar de pensar em uma humana ao ponto de mal conseguir fazer seu trabalho. Seu superior direto, Kaito, era gentil com ela, e disse que ela não hesitasse em perguntar a ele caso estivesse preocupada com algo. Entretanto, como Kaito era da Facção Ira, que não pensava muito bem dos humanos, não havia maneira alguma de poder discutir o assunto sobre Miku com ele, então o tempo passou com um ar estranho entre eles.
Logo faria cerca de um mês desde que ela encontrou Miku pela última vez. Para os anjos, um mês mal era algum tempo, mas para os humanos, um mês poderia ser o suficiente para um evento grande acontecer e acabar.
Durante este período de mudança para a vigilância da fé em demônios, ela teria que ir mais uma vez ao mundo humano para trabalhar por enquanto. Com estas emoções desagradáveis e galantes revividas, ela preparou para descer. Logo que o trabalho de conquista terminasse hoje, ela iria ao encontro de Miku diretamente.  Mesmo assim, ela não planejou fazer nada quando isso acontecesse. Ela só queria se desculpar por beijá-la e ser honesta sobre os sentimentos que tinha agora—
Seu pesado bater de asas parecia um pouco mais leve, e abrindo suas asas, ela pariu à terra abaixo.
— Desculpe! Ela deve voltar amanhã ou depois de amanhã.
Já fazia um tempo desde que Rin visitou a mansão Cryinpt pela última vez.
Devido ao mau momento, Miku já havia saído, e Lily, que lhe fazia companhia, preparou um pouco de chá para ela. Como sempre, o chá que ela preparou estava delicioso.
— E? Já faz um bom tempo desde a última vez que a vi. Está ocupada no trabalho?
— Sim... acho que... sim.
Ela respondeu de forma vaga, como se estivesse a enganando. Era verdade que era uma época cheia, mas como seus pensamentos estavam mais em Miku que no trabalho, ela estava com a consciência culpada.
— Entendo! A Lady Miku não aprece ela mesma esses dias, então me perguntei se algo havia acontecido algo entre vocês duas. Desde aquele dia, você parou de vir frequentemente como vinha antes, afinal.
— Ugh... ngh, agh!
— Minha nossa! Você está bem?
Rin olhou para Lily, que estava sentada diante dela, enquanto se engasgava com o chá Darjeeling que estava bebendo. Por algum motivo... Por trás da expressão dela, ela sentia que Lily estava olhando para ela com uma curiosidade animada.
— De qualquer forma, suas reações são bem fáceis de entender, Lady Rin!
— Fi-fique quieta.
Ela geralmente era provocada por outros anjos por não conseguir guardar segredos, mas recentemente, até mesmo Miku e Lily começaram a provocá-la.
— E então...? Você e a Lady Miku discutiram?
— ...Não.
— Então... Você disse algo que deixasse o clima ruim entre vocês?
— ...Eu... não acho... que sim?
— ...Por que você parece tão insegura?
— ...É porquê...
Assim que Rin estava prestes a dizer “porque eu não entendo emoções humanas”, ela fechou a boca.
Ela quase se esqueceu que Lily não sabia que ela é um anjo. Agora, Rin estava ajustando seu poder para que pudesse ser vista como uma humana normal como Lily e escondendo suas asas de vista. Aqui, ela recebeu uma identidade de uma nobre livre vivendo em um país vizinho. Como ela sempre era tão natural entre elas, quase se esqueceu por um momento.
— Ah... É porque...a Miku disse que vai se casar... de repente.
— A vida sempre é repentina, cheia de altos e baixos; mas amanhã sempre será outro dia! Ninguém sabe o que há guardado... Isso, é o romance.
O que Lily estava imaginando quando disse isso, com suas bochechas levemente rosadas?
— Não, o que quero dizer é...
— Em outras palavras!
Apontando do outro lado da mesa com o dedo indicador e posando como um detetive que acabara de desvendar o caso, Lily falou.
— Eu não gosto disso... A Lady Miku está pensando em casamento sem me consultar sobre isso!
— Hm...
— Aaah... Mesmo que a gente sempre tenha vivida sem segredos entre nós...
— Hum...
— E mesmo assim... Mesmo assim...! Antes que eu percebesse, ela estava tão amigável com aquele tipo de homem...!
— Huum......
— Que ato traiçoeiro! Agora que chegou a este ponto, eu vou te matar e então matar a mim mesma!
— Isso é um exagero.
Rin bateu na cabeça de Lily quando ela começou a murmurar como um ator com gestos dramáticos, Lily esfregou sua cabeça, mesmo sendo óbvio que não doeu.
— Mas é assim que você se sente, correto?
— ......
— Vou aceitar seu silêncio como uma afirmação.
— ...N-não tanto... a ponto que eu queira matá-la.
— ...Isso foi só uma brincadeira. Você é surpreendentemente radical, Lady Rin. Hum, entendo! Hum...
O quê...?
— Ah, não é nada. E o que você pretende fazer, Lady Rin?
— ...? O que eu pretendo... fazer?
— Hm, por exemplo... você quer evitar o casamento da Lady Miku?
— Pre-prevenir?! Não, eu... Além disso, ela disse que ainda nem foi finalizado...
— Hã? Ah, falando nisso, enquanto a Lady Rin estava ausente, foi formalmente decidido! Se me lembro bem... a cerimônia acontecerá no mês que vem!
— !! Eu... entendo...
Ela não conseguia esconder seu choque ao ouvir as palavras de Lily.
— Você vai ao casamento?
— ......Eu não quero ir.
— ...É mesmo...? Mas eu...
De repente, a visão de Rin foi ofuscada por um preto ominoso.
— ...me dei o trabalho de preparar uma nova roupa para você vestir no casamento.
Lily agiu como se estivesse desabando em pesar, e deu um alto e desanimado suspiro. No fim, o que mais importava para ela é que seu novo modelo foi desperdiçado.
— Eu, já, disse! Eu nunca mais vou vestir preto!
— Mas é um casamento! Todos estarão vestidos de preto! Sabe disso?
— ...
— O modelo que você usou no banquete na última noite combinou tanto com você. Você estava monopolizando todos os olhares das jovens convidadas!
— Hãããã?
— Francamente, você percebeu, não é? Você é tão pecaminosa! Sem saber que era um cross dress naquele dia, todas as outras garotas estavam caidinhas por você! Que impuro! Ah, mas esta aura perigosa é um pouco... Bem, deixando isso de lado... afinal, a Lady Rin tem olhos apenas para a Lady Miku!
Cross dress — já que ela geralmente parecia uma garota, isso provavelmente era verdade.
— ...Me pergunto se cometi um erro, no fim de tudo...
Enquanto Lily zombava dela, Rin murmurava para si mesma. Para os humanos, o casal mais comum consistia de um homem e uma mulher, para o bem da reprodução. Entretanto, de vez em quando, ela ouvia falar sobre duas pessoas do mesmo gênero que se apaixonavam... Mas, mesmo assim, era estranho que ela, um anjo com a aparência de uma garota, estar interessada em uma humana que também era uma garota, como ela.
Ou o problema estava no fato de que anjos e humanos não são compatíveis?
— Hã?
— ...Ah, não, não é nada. Não se preocupe.
Embora seus sentimentos devessem estar um pouco mais claros após conversar com Meiko, ela sentiu que eles ficaram mais pesados.
— ...Eu não acho que você esteja errada.
— Hã?
Quando ela ouviu o som de uma voz, ela viu Lily vir ao seu lado, sorrindo quase com pena.
— O mais importante... é a qualidade da alma. Afinal, aparências não são nada mais que o “receptáculo” que mantém a alma.
— ......! Isso...
Era quase... como que “elas” fossem a mesma—
— No banquete, você estava sozinha, não é? Você conversou com a Lady Miku em segredo, não é?
— ......Hah... Você tem ouvidos diabólicos.
Um dia, Rin retornaria essas palavras para a pessoa diante dela. Por um breve momento, ela entrou em pânico, pensando que Lily tivesse visto sua verdadeira identidade. Mesmo sendo humana, às vezes ela dizia coisas que surpreendiam. Embora essas palavras sempre a ajudassem, de alguma forma...
— Você deveria viver como quer, e ser honesta com seus sentimentos. Afinal, apenas se vive uma vez.
Dizendo isso enquanto sorria, não se pensaria que ela dizia brincadeiras idiotas há um momento. Agora, Lily parecia ainda mais velha e solene que Rin, que tinha mais de cento e cinquenta anos.

Terminando o chá de Lily, Rin lentamente voltou para o Paraíso. Deixando de lado o fato de que ela estava tão animada para vir, e no final, a pessoa que ela queria ver não estava lá, ela ficou um pouco desapontada. Embora tenha conseguido coragem após conversar com Lily, se elas se encontrassem agora, ela não saberia o que dizer. Pode ter sido algo bom elas não terem se encontrado hoje, então. Entretanto, decidir não a ver nunca fora uma opção desde o começo. Nada de bom poderia vir de fugir assim. Ela voltaria amanhã. E então—
— Que fantástico encontrá-la novamente em um lugar assim!
Ela ainda não sabia o que dizer. Primeiro, ela provavelmente pediria desculpas pelo que aconteceu no mês passado.
— Eeei! Pode me ouvir?
Mas como ela poderia se desculpar? Apenas dizer “sinto muito!” do nada?
— Eeeei.
De repente, seu braço esquerdo foi segurado com muita força, surpreendendo-a.
— Por que está distraída assim? Tem algo te incomodando?
Quando se virou, Rin viu o demônio ruivo que havia lutado contra ela antes, sorrindo casualmente como antes. Por um momento, ela não conseguia responder nesta situação repentina, mas após uma pausa, ela tentou libertar seu braço. Mas seu aperto era muito forte, ela não conseguia resistir. O demônio era muito mais forte que ela. Ela se lembrou de como foi superada por sua força na batalha anterior.
Se ela não conseguisse vencer por força, não teria escolha senão negociar com ele.
— Hm? Você está quieta hoje! Finalmente percebeu que eu sou o melhor entre nós dois?
— ...tsk. O que você quer?
Era frustrante não poder dizer nada de volta, mas o nível deste oponente estava além do normal. Ela não podia agir descuidadamente como na última vez e causar problemas para todos de novo.
— Hum... Eu não te chamei porque quero agora. Eu só vejo você de vez em quando durante minhas voltas.
— ...Até demônios... dão voltas, não é?
— ...pft—
— ...?
— Ahahahaha!
O demônio de repente teve um ataque de risos. Rindo enquanto apertava seu estômago, ele parecia muito diferente de como ela via os demônios — cruéis e astuciosos.
— O que é tão engraçado?!
— Ahaha... Ah! Ah, não, não. É que você parece estar nos entendendo mal.
— Entendendo mal?! O quê?!
— Mesmo que você coloque todos nós, demônios, juntos, ainda há os bons e maus entre nós.
— ...! O que... O que quer dizer?!
— É o mesmo no seu precioso Paraíso, não é? Anjos tem diversas personalidades também.
— Tsk.
— Há aqueles como você: genuínos, puros e adoráveis. E também há anjos que fazem coisas terríveis, bem pior que os atos dos demônios, sob o disfarce do poder sagrado, não é?
— O qu...! Não diga bobagens!
Não estou. E de qualquer forma... os demônios surgiram de anjos caídos, sabe?
Ouvindo essas palavras, seu corpo tensionou, deixando-a incapaz de falar.
Demônios... vieram de anjos?
— Bem, acho que esse tipo de coisa não importa. Demônios ou anjos. Enfim...
O demônio soltou seu aperto um pouco e encarou seu rosto.
— Aconteceu algo? Você está bem mais branda que a última vez que nos encontramos.
— ...Não é da sua conta.
— Hm... O quê? Você discutiu com uma humana?
— ...!!
Mesmo sendo um demônio dizendo isso, fez sua cabeça se levantar.
— Hm, na mosca. Minha intuição é bem apurada! Acho que provavelmente deve ser porque eu sou um demônio. Os segredos das pessoas... Como é parte do yin, a força das trevas, eu sempre consegui ver bem.
— ...
— Está no seu rosto. Algo como, você é completamente culpada? Ah, você se apaixonou por um garoto humano?
— !!
— Ah! Eu estava brincando, mas eu acertei?
— Tsk.
Mesmo que quisesse negar, as palavras não surgiam. Se fosse para esse demônio com boa intuição, qualquer explicação que ela desse seria inútil.
— Ah, bem... que pena. Você é adorável, eu estava querendo flertar com você.
Rin puxou sua arma e rapidamente o deixou em sua mira.
— Ei, espere! Por que está ficando com raiva?!
— Não brinque comigo!
— Eu não estou! Eu gosto de anjos, já que eles são fofos. Quando se trata de anjos, cabelos loiros e olhos azuis são ideais, não é? E você parece com um anjo perfeito.
— Isso é preconceituoso!
— Mesmo? O Anjo Lendário de antigamente, diziam que ela era uma bela garota com cabelos loiros e olhos azuis, não é?
— ...Isso... não tem nada a ver com agora.
Embora planejasse atirar com força bruta, como o demônio segurava seu braço, ela não conseguia usar a força.
— Nossa, essa foi por pouco! Você não pode me matar, sabe? Enfim, não acho que seja uma boa ideia você me matar.
Dizendo isso enquanto facilmente lidava com sua resistência, ele sorriu; as próximas palavras a saírem de sua boca soaram doces e sedutoras:
— Você não quer saber...? Como capturar aquele humano para você?

Eles estavam dentro de uma catedral antiga na periferia da cidade. Após mover o monumento de pedra embutido sob o altar, um mal iluminado túnel subterrâneo foi revelado. Dependendo das poucas velas acesas nas paredes, os dois desceram uma escadaria escura. Sem nem mesmo uma curva, o caminho continuava em uma linha reta. A escadaria escura dava um ar sombrio, como se eles estivessem continuando diretamente até o inferno. Rin encarou as costas do demônio que andava diante dela.
Perto da ilha Rulen, no centro de Alphine, ficava a pequena ilha de Minole. A ilha central, Rulen, e as ilhas ao redor, tinham sua própria política, e até mesmo Rulen, que era o centro do governo, não podia interferir muito com o governo das outras ilhas. Isso era devido ao fato de que uma vez, há muito tempo, os nobres que criaram o Reino de Alphine criaram políticas individuais para a terra, e por isso, a cultura de cada ilha era um pouco diferente.
A ilha para a qual o demônio havia a levado, Minole, era uma pequena ilha ao noroeste de Rulen, com a população de quinhentas pessoas. Como geralmente fazia patrulhas de vigilância em Alphine, Rin já havia voado diversas vezes para esta ilha antes, mas era a primeira vez que via este lugar que estavam agora. O esconderijo de um demônio poderia ser em um lugar como esse? Talvez por causa de sua ansiedade, seu coração estava acelerado desde antes. Seria a primeira vez que ela colocaria os pés na base de um inimigo — e um que era claramente mais forte que ela.
Finalmente, eles viram o fim do que parecia uma escadaria infinita. O demônio que andava diante dela deu um passo abaixo e abriu a porta que estava diante deles. Fez um rangido desagradável enquanto abria.

— E aí. Velha, está aí?
Assim que Rin passou pela porta que o demônio havia a guiado, uma cena estranha se expandiu diante dela. Todas as paredes do vasto interior estavam repletas de estantes de livros que a amontoavam até o topo. O teto ficava tão alto que não dava para ver de onde estavam. No centro da sala havia uma grande mesa, e ao seu redor, máquinas que pareciam equipamentos de laboratório, emitindo sons baixos enquanto operavam. Apenas ver as fileiras de ossos de animais, plantas de aparência arrepiante, e fluidos de cores suspeitas fazia ela querer sair.
Enquanto ela estava para naquele lugar, desnorteada, uma senhora apareceu pela porta que parecia sair na sala ao lado.
— ...Minha nossa, então é você? O que você quer uma hora dessas?
A senhora, que parecia uma “bruxa” de um conto de fadas, olhou na direção deles com uma expressão irritada. Embora sua aparência seja um pouco desagradável, ela não era um demônio, mas uma humana normal. Porém, como parecia que a senhora conseguia ver a essência dos anjos e demônios, era difícil dizer que ela era normal.
Quando seus olhos se encontraram, um sorriso sórdido apareceu no rosto da senhora.
— Ah, o que temos aqui... já faz um tempo desde que vejo um anjo pessoalmente.
— Ela é fofa, não é?
— Ah, sim... Ela é muito adorável...
Havia algo como insulto e crítica em seu rosto enquanto ela ria chamando-a de adorável.
— Agora... O que você quer aqui, mocinha?
Enquanto ela girava um fraco marrom-avermelhado sobre a mesa, a senhora falou.
— ...
Incapaz de responder, o demônio ao seu lado veio ajudar Rin.
— Você mencionou isso antes, não é? Uma poção do amor. É por isso que estamos aqui.
— Uma poção do amor... Eu já fiz algo assim...?
— Você fez, não é? Já esqueceu, velha?
— Esses não são modos de falar com uma idosa! De qualquer forma, uma poção que eu fiz uma vez não pode ser feita de novo.
— Hã?! Que seletividade sem sentido é essa?
— É melhor você desistir...
— Que diabos... Ah! O que você vai fazer?
O demônio olhou na direção de Rin. Ele tinha uma expressão desapontada no rosto, como se tivesse sido inútil apresentá-la.
— Não é como se eu precisasse de uma poção do amor. Além disso...
Além disso... Por que ela faria a Miku beber uma poção do amor? Isso faria parecer que ela estava apaixonada por Miku. E além de ter sido atraída, era uma desgraça que estivesse sendo aconselhada e ajudada por um demônio, seu inimigo.
— Hum. Mocinha, parece que suas preocupações são bem complicadas... Sinto uma pontada de tabu.
No momento em que ouviu a palavra “tabu”, o coração de Rin acelerou.
— Hã... um tabu, é? Que assustador.
Enquanto um brilho suspeito brilhava nos olhos do demônio, ele balançou as duas mãos.
— E você pode falar algo? Demônios são seres terríveis. Deixando os outros confiarem neles e quando percebem, estão descendo a escada para o abismo juntos.
Enquanto a senhora zombava do demônio, ela olhou para Rin.
— Mocinha, isto está se tornando uma conversa complicada. Se não quer ouvir isso, recomendo que saia.
— O-o que quer dizer?
— Você realmente gosta tanto dessa humana?
— O... O quê?
Lá estava de novo. Assim como quando o demônio adivinhou no que ela estava pensando, até mesmo essa senhora conseguia ver através dela?
— Ah. Eu vou sair agora. Vou deixar vocês duas à vontade.
Dito isto, o demônio virou-se para sair.
— Hã? Es-espere!
Em pânico, Rin o chamou. Ele a trouxe até aqui para apresentá-la a uma senhora idosa?
— Bem, não se esforce tanto. Se você se tornar uma de “nós”, será bem-vinda a qualquer momento.
E com isso, ele desapareceu pela porta.
Embora ele tenha dito “nós”, esta senhora era uma humana, então o que ele queria dizer com isso?
— Parece que ele o trouxe aqui porque está interessado em você. Mas isso não quer dizer necessariamente que ele está pensando em forçá-la a fazer isso.
— M-mas...
— A maior parte dos demônios é instável. Bem, independente da aparência dele, ele é intrometido, e tem a tendência de mudar de ideia ao longo do caminho. Incidentalmente...
Estudando-a da cabeça aos pés, estava humana deveria ser muito mais jovem que ela, mas por algum motivo, Rin sentia-se estranhamente nervosa ao seu lado.
— Qual é o seu nome?
— Hum, é... Rin.
Surpreendentemente, a senhora perguntou algo assim. Vendo como ela era uma conhecida do demônio de antes, e não estava surpresa em ver um anjo, parece que ela era uma humana que sabia muito sobre “esse mundo”.
— Rin... hm?
— Hum, e você é?
— Até mesmo meu nome foi esquecido há muito tempo.
— Mas eu acho que sou mais velha que você.
Não era por sua aparência, mas era como se essa pessoa, que de alguma forma dava a impressão de ser muito mais velha que ela, estivesse guardando alguns segredos.
— Rin, por que você veio aqui?
— ...E-ele me trouxe aqui.
— Não foi o que perguntei. Estou perguntando por que você foi tentada por ele? Você é um anjo tão tolo assim?
— ...
Rin ficou petrificada com essas palavras. Era frustrante admitir, mas parecia que esta outra era bem hábil. E, por algum motivo, quando ela falava com essa pessoa, era tomada por uma estranha tentação de querer dizer a ela seus verdadeiros sentimentos que não disse a ninguém.
— ...Eu estou interessada em alguém. Bem... é uma garota humana.
— Hum... No Paraíso deve haver uma regra que proíbe que os anjos se envolvam com um humano específico.
— ...! Ah, é por isso que, hum...
Quando começou a falar, ela sentiu a culpa consumi-la.
— Espere, isso é apenas o que a regra dita. Há muitos anjos que deixaram o Paraíso porque se opunham a uma lei tão absurda.
— ...!! Vo-você sabia disso?
— ...Bem, eu conheço vários assim.
De repente, Rin lembrou do rosto de seu parceiro que se separou dela há vinte anos. Talvez ele também seja um conhecido desta senhora...
— A última vez que vi um anjo foi há quarenta anos. Dede então, não ouvi mais nada sobre anjos caídos. Ouvi dizer que recentemente as leis do Paraíso ficaram mais rígidas.
— É... verdade...
Ele caiu há vinte anos... neste caso, ela não o conhecia. Rin ficou um pouco desanimada por isso.
— Me diga, agora, a humana que você está encantada, o que ela pensa de você? Para começar, ela consegue ver sua verdadeira forma?
— ...Ah, hum... A Miku... me salvou. Há um ano, eu lutei contra aquele demônio de antes... Eu fiquei ferida e não consegui voltar para o Paraíso, mas... ela— a Miku estava passando por lá, e pediu que eu descansasse em sua casa, e eu fiquei em dívida com ela...
— Entendo... Em outras palavras, foi amor à primeira vista, hm?
— Não, você está errada! Naquela época, eu não...
— Então por que você decidiu ir com uma humana que acabara de conhecer? Não importa quão sério seja o ferimento, anjos têm a capacidade de curar a si mesmos.
— É porque... era minha primeira vez falando com uma humana... E eu pensei que era incomum. Ela poder ver minha verdadeira forma, assim como você...
— ...Nesse caso, se eu estivesse passando por perto naquele momento e estendesse a mão para você, você viria comigo sem pensar duas vezes?
— Sem chance! Definitivamente não! ......Ah.
— Você é honesta. Mas o que importa é que isso é sua prova.
Os batimentos de seu coração eram a resposta para as palavras da senhora.
— Mas se você diz que foi amor à primeira vista, então...
— Começou como um amor à primeira vista, e após muito tempo passar, estes sentimentos viraram certeza. Isso que é o amor.
— ...Isso... é mesmo amor?
Estes eram os sentimentos que ela não queria admitir. Anjos não amam. Não é permitido a eles. Eles têm apenas a afeição. Rin ouviu que o amor era uma emoção forte que significava dedicar todo o seu ser para outro. Mesmo assim, esta emoção era proibida para os anjos que viviam para sua missão e para “Deus”, e não importava quão próximo um anjo fosse do outro, quem terá a prioridade é “Deus”. Os anjos que não conseguem fazer isso são tratados como hereges, e sujeitos a reeducação.
— Embora talvez você não consiga entender, não é impossível. Anjos não amam, correto? Mas você percebeu o que era. Apenas aceitar é o bastante. Então, agora há dois caminhos diante de você.
— Dois... caminhos?
Desde um tempo atrás, devido às habilidades de conversa da senhora, Rin apenas conseguia repetir suas palavras.
Ela estava tão atraída desta vez que era inevitável.
— Sim. O primeiro é... de acordo com a lei, sua alma será reduzida mais uma vez à fonte da vida; que é chamada no Paraíso de Árvore da Vida. Lá, suas atuais memórias “desnecessárias” e emoções serão removidas, e você renascerá em um estado puro como “Rin”.
— ...!! Mas isso...
— Você não sabia? Já faz muito tempo, anjos que se tornavam hereges tinham suas memórias roubadas, e suas almas resetadas. Mas, ao menos suas vidas são deixadas intactas. Tiveram piedade neste aspecto.
— ...Eu nunca ouvi nada sobre hereges nem nada do tipo em toda a minha vida...
— Não é uma surpresa. Pelo jeito, você ainda é jovem. Quem está no poder mantém as partes sombrias trancadas a sete chaves. Bem, é o mesmo no Paraíso e nesta terra.
— !!
— Rin não podia dizer que não estava familiar com isto. Em alguns anos, algum anjo misteriosamente sofria amnésia após desaparecer durante uma missão. Mas ela sempre ouvia que era por causa de uma batalha contra demônios, ou um acidente por serem descuidados, e nem ela nem ninguém ao seu redor parecia achar nada estranho.
Uma gota desagradável de suor escorreu em suas costas.
— Em todo caso, se seu encantamento por essa humana for descoberto, você terá o mesmo destino. Mas isso depende de você. Se não quer ser exposta, então deveria cortar qualquer futuro com aquela humana. É simples assim.
— ...
— ...Talvez eu esteja a provocando demais. Se estes sentimentos pudessem ser esquecidos tão facilmente, não teriam tantos anjos caídos nestas terras até hoje.
— ...! Anjos caídos.
— Cair... Este é o segundo caminho. A maioria dos anjos que caíram foi por amor. Embora seja raro, há também os que fizeram isso por outros motivos.
Anjos caídos. O ato mais traiçoeiro contra Deus e o Paraíso. É assim que aqueles que abandonam suas missões como anjos e caem à terra são chamados.
— Embora sejam chamados de anjos caídos, há diversos tipos. Há aqueles que fizeram contratos com demônios e tiveram as asas manchadas de preto, e aqueles que continuam como anjos, selam seu poder, e vivem foragidos. Embora a maioria faça contrato com demônios para converter seu poder sagrado para poder das trevas... Caso contrário, eles logo são descobertos pelo Paraíso. E então, tem...
— ...?
— Os humanos... aqueles que desejam viver entre os humanos querem se misturar o mais naturalmente possível no mundo humano. Por isso contam com a minha ajuda. Com a “nossa”, que, embora humanos, possuímos poderes — poderes extraordinários.
— Hã?
— Mas isso é irrelevante. Eu disse que no passado vários anjos vieram até mim, querendo viver no mundo humano, não é?
— Sim.
— Viver no mundo humano enquanto desvia da atenção do Paraíso é bem difícil de se fazer. Não é algo que seja possível ser feito apenas com o poder da própria pessoa. Primeiro, para não ser encontrado pelo Paraíso, a energia sagrada deve ser completamente selada. Porém, anjos sem energia sagrada alguma... não, o mesmo vale para os anjos— eles inevitavelmente morrerão.
— ...É-é claro que sim.
— Depois da morte, tudo é perdido. Mas, há duas formas de viver selando o poder. A primeira é equilibrar o poder sagrado com o poder das trevas... Usar o poder que um demônio possui. Formando um contrato com um demônio específico, usar sua habilidade de converter o poder sagrado de alguém para o poder das trevas. Em outras palavras, se tornar um demônio.
— ...Um... demônio...
— Bem, sua aparência não sofrerá muita alteração.
— ...
— A outra forma... é usar isso.
A senhora estendeu a mão até o armário ao lado da mesa e pegou uma velha e esfarrapada balança.
— Uma balança...?
Parecia uma balança, mas tinha apenas um prato.
— É chamada de Balança do Julgamento. Em troca de conceder um desejo do usuário, algo de mesmo valor é sacrificado para manter o equilíbrio da balança.
— O que... isso significa?
— Ahh... permita-me explicar. Suponha que você tem um desejo que queira realizar, não importa o que custar. Neste caso, você desejará nesta balança. Mas, no momento em que este desejo for concedido, você sentirá a alegria do que recebeu e ao mesmo tempo, um valor igual de tristeza. Em outras palavras, terá um equilíbrio. A pessoa que usou isto da última vez foi um homem que queria curar sua esposa, que tinha uma doença terminal, Ele sabia dos grandes riscos que a balança tinha, mas, mesmo assim, seu sentimento de querer a melhora de sua esposa eram mais fortes. Com o poder da balança, sua esposa ficou perfeitamente bem novamente. Porém, deste dia em diante ela não amava mais o marido. Perder sua esposa e ser amado por ela tinham o mesmo valor para ele. E quanto ao seu destino... para ele, sua esposa era o único motivo para viver. Após ser abandonado por ela, ele deixou suas últimas palavras de mágoa, e tirou sua vida...
— ...
— Este é o tipo desta ferramenta. Se você usar esta balança, o que desejará? E do que desistirá? ...E então, qual caminho você vai tomar?
Qual caminho... Ela deveria ser fiel a Deus e descartar suas “memórias desnecessárias” e renascer como um anjo? Ou deveria trair Deus e o Paraíso, e cair à terra para escapar...?
Ela deveria se tornar um demônio ou uma humana?
— ...
— Bem, você com certeza está em conflito. Mas mesmo que suas memórias sejam apagadas no Paraíso, serão apenas as coisas relacionadas à pessoa que você amou. Você não vai perder tudo.
— Minhas memórias... Eu não quero... perder as memórias que tive com a Miku...
— ...Eu presumi quando você chegou aqui. O que você quer?
— ...Eu não quero esquecer minhas memórias com a Miku! Definitivamente não... Mas, eu não posso... trair o Paraíso... ou Kaito e os outros...
— Você é uma garota egoísta, não é? Não se pode ter tudo na vida.
— Mas—
— ...Do meu ponto de vista, já consigo ver a resposta dentro de você.
— ...!!
— A “alma” sempre é verdadeira. Por causa disso, é mais difícil viver enquanto mente para si mesma.
— ...O que... devo fazer?
— Pelo que você quer viver?
Fizeram essa mesma pergunta para Rin antes. Ela se lembrava das palavras que ele, que caiu, disse naquele dia.
— Eu... Eu...
Em pânico, ela não conseguia encontrar as palavras.
— Fique calma. Feche os olhos e respire devagar. Entendido? Tente lembrar as memórias dos momentos felizes, dos momentos tristes e sentimentos gentis... Agora, o que você está vendo?
Assim como a senhora disse a ela, Rin fechou os olhos e respirou devagar. Memórias felizes fluíram em sua mente: quando ela cultivou maçãs com Gumi e Meiko e todos os outros. Maçãs deliciosas. Elas levaram para Gaku, embora ela parecesse um pouco incomodada, estiveram com a Luka na hora do chá. Sempre conversavam sobre muitas coisas, e ela pensava em brincadeiras bobas que o deixariam com raiva dela... Kaito. Ele zombava dela, dizendo que nunca houve um anjo que caiu da árvore, mesmo tendo asas. Mesmo quando ela cometia erros no trabalho, ele dava gentilmente seu apoio enquanto a repreendia. Eles voaram pelos céus juntos... Assim como ela fez com ele, que não estava mais aqui. Ele, olhos azuis e gentis— matavam trabalho juntos, pensavam em pegadinhas para fazer contra o Kaito. Eles eram tão gentis. Todos eram tão calorosos e gentis.
E mesmo assim—
Quando Rin abriu os olhos, lágrimas haviam começado a escorrer.
— ...O que você pensou agora... Essa é a sua resposta.
— ...Eu... Kai... to... pessoal... Eu... sinto muito.
Por causa das lágrimas que fluíam livremente agora, como se saíssem de uma represa aberta, o rosto da senhora diante dela ficou um pouco borrado. A próxima coisa que viu foi a mão enrugada da senhora acariciando gentilmente sua cabeça. O calor de sua mão era tão gentil que ela não conseguia parar suas lágrimas.
— Por que... como...
— ...Não se preocupe. Quem poderá dizer que esta “resposta” é a errada?
Em uma forma reversa, estas palavras lhe deram alívio, e ela não conseguia mais parar os sentimentos que escondia no fundo de seu coração de transbordarem agora. Ela sempre foi terrível em mentir.
Aqueles dias gentis e quentes. Sua missão orgulhosa como um anjo. Tantas destas coisas preciosas, insubstituíveis memórias acumuladas, mas tremeram diante do sorriso daquele dia, quando ela lhe estendeu a mão.

Eu caí de amor por ela.

O que Rin pegou da senhora foi o contrato — letras douradas em um papel preto como o breu.

Rin modestamente bateu na janela. A mansão Cryinpt era bem quieta no meio da noite, principalmente pelo fato de que todos exceto pelos servos do turno da noite estavam dormindo. O quarto de Miku era no canto do terceiro andar, que recebia muita luz do sol durante o dia, e sempre que ia apenas vê-la, Rin sempre vinha para a janela deste quarto. Já se passou um ano desde que Miku prometeu abrir para ela quando ela batesse.
Rin esperou por um tempo, e quando não houve resposta, tentou bater mais uma vez. Se ainda não houvesse uma resposta, então ela desistiria. Talvez ela já tenha ido para a cama... Ou talvez... Se ela estivesse sendo ignorada—
Assim que estava começando a ficar desencorajada com pensamentos negativos, a janela de repente abriu, fazendo com que ela voasse para cima em reflexo. Miku estava olhando para ela com uma expressão um pouco surpresa.
— H-hum...
Se passou apenas um mês desde aquele banquete... Embora para os anjos, um mês parecesse um momento, por que parecia que tanto tempo se passou? E, agora que o rosto da pessoa que não saía de sua cabeça durante este período estava diante dela, ela não sabia o que dizer. Era tão patético. Enquanto Rin gaguejou tentando desesperadamente encontrar as palavras, Miku falou primeiro.
— Sinto muito pela última vez.
— Hã?
— Foi tão repentino, então eu fiquei surpresa...
— Ah... H-hum sobre isso...
— Foi como... um gesto social, não é...?
— Hã...?
— Você disse que a cultura dos anjos é diferente da cultura que temos aqui. Parece que eu esqueci algo tão óbvio. Para nós, este tipo de coisa é feito entre namorados, mas... Eu me lembrei que você tinha dito que para os anjos, tudo é baseado em afeição... Você me beijou porque somos amigas, mesmo que eu seja uma humana. E mesmo assim, eu estava surpresa, e fugi de você...
— Ah... S-sim.
Rin não conseguia dizer nada além disto. Por algum motivo... Seu peito doía como se seu coração estivesse se partindo. Era tão doloroso que lágrimas ameaçaram se formar.
O beijo de um anjo era uma prova de bem-aventurança. Não havia sentimentos românticos envolvidos, apenas afeição. Embora Miku tenha inventado esta “cultura” sozinha, estava completamente correta.
Mas... aquele beijo foi...
Rin queria negar em voz alta, dizendo que ela estava errada, mas após finalmente conseguirem falar, uma parte dela estava com medo de deixá-la incomodada de novo. Sorrindo levemente enquanto suprimia os conflitos em seu coração, Miku se inclinou contra a varanda e falou após recobrar seus pensamentos.
— Foi... oficialmente decidido que eu vou me casar com o Sr. Iceburg. Você ouviu da Lily?
— Sim... ela me disse... no outro dia.
Ela ouviu de Lily, mas ouvir da própria Miku — em algum lugar de seu coração, Rin estava implorando para ser salva. Se ao menos ela pudesse mudar de ideia... Desde que percebeu ser amor por Miku, ela sentiu que tudo mudou para acomodar seus desejos. Aquelas emoções obscuras se agitaram. Ela desejava que pudesse monopolizar tudo sobre ela... Estes sentimentos — quão gananciosos eram. O amor era algo tão egoísta e tolo.
— Miku... você está mesmo bem com isso?
Escondendo os próprios sentimentos sujos, Rin disse palavras que ela parecesse apenas estar preocupada com ela.
— ...Eu disse antes. Eu tenho algo muito importante para mim, e não posso trair isso?
— É pela sua família? Pelo bem de sua mãe? Pelo bem de todos os outros?
— Eu... acho que seria... pelo bem de todos.
— Então, Miku... E quanto ao seu próprio bem? Quem vive por você, Miku?
— Is-isso...
— Esse tal de Iceburg. Para mim, não parece que ele te ama! Assim como os outros nobres, ele só tem os interesses em mente!
— ...!!
— Miku, você está sempre... sempre pensando apenas nos outros! Você nunca pensa na sua própria felicidade! Isso é certo? Está mesmo tudo bem com isso?
Ela não conseguia impedir as palavras de saírem. Quem era ela para dizer isso? Até um momento atrás, ela só pensava em como não queria que a Miku a odiasse, então como ela—
— A vida dos humanos é curta, sabia? Comparado a quanto tempo os anjos tem, realmente é um piscar de olhos! Mas mesmo assim... Suportar coisas que você não gosta, esconder seus verdadeiros sentimentos... de agora... até o dia em que morrer... viver pelo bem dos outros ao seu redor... isso é tão...
Ela queria dizer como isso era triste, mas as palavras não saiam de sua garganta. A garota diante dela estava tremendo com uma expressão ferida. Rin descobriu os sentimentos que Miku sempre trancou em seu coração, sem a intenção de revelar para ninguém. Em um momento, seus olhos ficaram cheios de lágrimas. Se não fosse pela ocasião, Rin pensaria que sua expressão estava bela.
— Eu... Eu...
Suportando as lágrimas até que elas finalmente desabaram, Miku gritou seus verdadeiros sentimentos.
— Na verdade... Eu só quero viver livre! Eu quero... me apaixonar! Eu quero amigos! Eu não quero estudar o tempo todo, quero me divertir também... Eu queria que alguém me elogiasse... dissesse que eu fiz bem! Quando eu estiver triste, eu quero alguém para me abraçar! Eu só... Eu só quero ser amada, sem que me peçam nada em troca!
Junto com seus gritos tristeza, as lágrimas continuavam a escorrer de suas bochechas sem parar. E pensar que ela, que sempre estava sorrindo, na verdade estava escondendo tantas emoções. Rin abraçou seu corpo magro e frágil.
— Quando estiver muito difícil, você pode chorar... Porque eu vou te deixar chorar.
— Rin...
— Você é importante para mim, Miku.
— ...
— Eu estarei ao seu lado... Sempre.
— ...
— Eu sempre... estarei ao seu lado para protegê-la.
— ...
Miku não disse nada. Ela apenas continuava a chorar em soluçar. No momento em que Rin viu suas lágrimas, ela percebeu. Ela estava convencida de que seus sentimentos não eram incomuns, e que não eram heresia nem nada errado.
Eu encontrei. Aquilo que você falou... Embora tenha levado tanto tempo, acho que finalmente entendo.
— Para qual propósito você acha que a “vida” existe?
Tenho certeza que existe para ser usada para o bem de alguém.

A Catedral Claude, banhada pelo crepúsculo. A mais magnífica e memorável catedral dentre as construções no mundo humano — quando foi a última vez que vim aqui? Também foi o lugar onde eu encontrei com ela pela primeira vez.
Miku—
Você, uma humana, partirá muito antes que eu, um anjo. E, um dia, eu estarei em um mundo onde você não existe mais.
Desde que a encontrei, meu mundo mudou. O mundo que eu pensava que era colorido e rico, brilhava ainda mais, e por causa dela, estes olhos refletiam puro branco ao puro preto, e muitas cores vívidas entre as duas.
Na minha mão direita estava uma arma.
E o que eu mirava era uma simples maçã.
Suculenta e emitindo um aroma doce, “minha alma”, que estava um pouco madura demais, logo apodreceria. Estava escrito no contrato que eu recebi daquela senhora: “Ponha o recipiente de sua alma em um lado da balança, e faça seu pedido”.
Eu quero me tornar humana. Por isso decidi terminar minha vida como anjo. Não importa o que eu perca em troca do meu desejo. Não importa o que aconteça comigo, enquanto eu puder ficar ao lado dela como humana, consigo tolerar qualquer dor.
— Adeus...
Eu não sei para quem eram estas palavras. Aquela de quem estava me despedindo era o anjo Rin, e aquela vida. No fundo de minha mente, sorrisos gentis tremiam. Meus companheiros no Paraíso, meus superiores, e—

Como se para cortar estes sentimentos, eu puxei o gatilho.
Inúmeras penas brancas rígidas dançaram para cima no vasto céu.

Que asas lindas... Apenas o sorriso de quem disse isso continuou preso em minhas pálpebras.

˚ ˚ ˚ ˚ ˚
O coração dela repentinamente foi tomado por uma dor intensa, parando sua respiração. O homem ao seu lado, filho da família Iceburg, olhava para ela, admirado.
— O que houve, Miku? Não está se sentindo bem?
— ...Ah, não. Não é isso. É que... meu peito doeu um pouco,
— Isso não é bom. Vamos ver um médico de uma vez.
— Ah, eu estou bem, então não se preocupe com isso, por favor.
— Mas, se meu anjo ficar doente, não conseguirei viver com o luto.
— Anjo...
Um anjo... ela se virou para a janela. Se anjos realmente existissem, eles estariam voando livremente com suas asas pelos céus?
— Se... eu encontrasse um anjo...
Ao lado dela, após ouvir que ela estava bem, ele imediatamente começou a olhar pelos trajes novamente.
— Eu queria voar com eles pelo vasto céu.
— Haha. Você diz umas coisas adoráveis. Mas não voe para longe. Eu vou ficar solitário.
— ...Ah, Sr. Iceburg.
— Falando nisso, este anel—
— Hã?
— Parece que você o trata como um tesouro, mas... eu gostaria que você usasse o anel de noivado que comprei.
— ...!!
O visconde lentamente pegou uma pequena caixa do bolso de seu peito, e pôs em seu dedo anelar esquerdo um anel com um grande diamante.
— Uau, é muito lindo.
— Combina perfeitamente com sua beleza.
— Obrigada.
— Fico feliz que você tenha gostado. Este anel de flor que você sempre usa— agora que você tem este, não precisa mais dele, não é?
— Hm? Ah, n-não.
— Então, eu vou guardar para você.
Ele disse isto, e tirou o anel que estava sempre em sua mão direita. Pensando nisso, por que ela sempre colocava este anel todos os dias? Ela não conseguia se lembrar de onde havia comprado. Enquanto encarava o diamante admiravelmente belo e que tanto combinava em sua mão esquerda, ela derivou em pensamentos.
A dor que ela sentiu em seu peito deve ter sido apenas sua imaginação. Mas—
Ela sentia solidão em seu coração, como se um buraco negro tivesse sido aberto. Parecia que ela havia esquecido algo muito importante.
Talvez fosse apenas por causa deste belo fim de tarde. O céu vermelho intenso parecia quase sentimental à vista, a cor era um tanto nostálgica.

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