segunda-feira, 1 de abril de 2019

Ring: O Chamado [Parte Um: Outono, Capítulo 5]

Asakawa continuou investigando a história das quatro vítimas sempre que tinha um minuto livre, mas tinha tanto trabalho a fazer que não havia chegado tão longe quanto esperava. Antes que percebesse, uma semana havia passado, era um novo mês, e tanto a humidade encharcada pela chuva de agosto quanto o calor do verão de setembro tornaram-se memórias distantes afastadas pelos sinais do outono que se aproximava. Nada aconteceu por um bom tempo. Ele criou o hábito de sempre ler cada centímetro das páginas de notícias locais, mas sem encontrar nada que parecesse remotamente similar. Ou será que algo horrível estava avançando devagar, mas certamente, onde Asakawa não conseguia ver? Porém, quanto mais tempo passava, mais ele sentia-se inclinado a achar que as quatro mortes tinham sido coincidências, sem nenhum tipo de ligação entre elas. Ele não via Yoshino desde então, também. Ele provavelmente havia esquecido de toda a história. Caso contrário, já teria contatado Asakawa antes.
Sempre que sua paixão pelo caso demonstrava sinais de minguar, Asakawa pegava quatro cartões de seu bolso para ser lembrado mais uma vez que não poderia ser apenas uma coincidência. Nos cartões ele havia escrito o nome dos falecidos, endereços e outras informações pertinentes, e no espaço restante, planejava gravar as atividades deles durante os meses de agosto e setembro, sua educação, e qualquer outra coisa que sua pesquisa pudesse resultar.

CARTÃO 1:
TOMOKO OISHI
Data de nascimento: 21/10/1972
Escola para garotas Keisei, sênior, 17 anos
Endereço: Motomachi 1-7, Honmoku, Naka, Yokohama
Aproximadamente 23h do dia 5 de setembro; morta na cozinha no primeiro andar de sua casa, os pais não estavam presentes. Causa da morte: falha cardíaca repentina.

CARTÃO 2:
SHUICHI IWATA
Data de nascimento: 26/05/1971
Academia Preparatória Eishin, primeiro ano, 19 anos
Endereço: Nishi Nakanobu 1-5-23, Shinagawa, Tóquio
22:54h do dia 5 de setembro: caiu e morreu em uma interseção em frente à estação Shinagawa. Causa da morte: infarto do miocárdio.

CARTÃO 3:
HARUKO TSUJI
Data de nascimento: 12/01/1973
Escola para garotas Keisei, sênior, 17 anos
Endereço: Mori 5-19, Isogo, Yokohama
Fim na noite de 5 de setembro (ou na manhã seguinte): morreu em um carro em uma estrada da prefeitura sob o Monte Okusu. Causa da morte: falha cardíaca repentina.

CARTÃO 4:
TAKEHIKO NOMI
Data de nascimento: 4/12/1970
Academia Preparatória Eishin, segundo ano, 19 anos
Endereço: Uehara 1-10-4, Shibuya, Tóquio
Fim na noite de 5 de setembro (ou na manhã seguinte): morreu em um carro com Haruko Tsuji em uma estrada da prefeitura sob o Monte Okusu. Causa da morte: falha cardíaca repentina.

Tomoko Oishi e Haruko Tsuji frequentavam o mesmo colegial e eram amigas; Shuichi Iwata e Takehiko Nomi estudavam na mesma escola preparatória e eram amigos: esse tanto foi esclarecido antes de precisar andar atrás de informações, que confirmaram o fato. E sobre o simples fato de Tsuji e Nomi terem ido dirigir juntos no Monte Okusu em Yokohama na noite do dia 5 de setembro, estava óbvio que eles eram, mesmo que não amantes, mas estavam ao menos flertando. Quando ele perguntou aos amigos dela, ouviu o boato de que Tsuji estava namorando um garoto de uma escola preparatória de Tóquio. Entretanto, Asakawa ainda não sabia quando e como eles se conheceram. Naturalmente, ele suspeitava que Oishi e Iwata estavam saindo, também, mas não conseguiu encontrar nada que confirmasse isso. Era tão possível quanto Oishi e Iwata nunca terem visto um ao outro. Em todo caso, o que havia para ligar esses quatro? Eles pareciam estar interligados de forma bem mais profunda para este ser aleatório tê-los escolhido de forma totalmente aleatória. Talvez houvesse algum segredo que apenas os quatro sabiam e foram mortos por causa disso... Asakawa tentou uma explicação mais científica consigo mesmo: talvez os quatro estiveram no mesmo lugar ao mesmo tempo, e todos foram infectados com um vírus que ataca o coração.
Ei. Asakawa balançou sua cabeça enquanto andava. Um vírus que causa falha cardíaca repentina? Vamos.
Ele subiu as escadas, murmurando consigo mesmo, um vírus, um vírus. De fato, ele deveria começar por explicações científicas. Bem, supondo que houvesse um vírus que causasse ataques cardíacos. Ao menos era um pouco mais realista que imaginar que algo sobrenatural estivesse por trás de tudo isso; parecia menos provável que fossem rir dele. Mesmo que tal vírus ainda não tenha sido descoberto na Terra, talvez tenha caído recentemente na Terra dentro de um meteoro. Ou talvez tenha sido desenvolvido como uma arma biológica e de alguma forma, conseguiu escapar. Não se poderia descartar a possibilidade. Claro, ele tentaria pensar nisso como um tipo de vírus por enquanto. Não que isso vá satisfazer todas as suas dúvidas. Por que todos eles morreram com olhares de espanto em seus rostos? Por que Tsuji e Nomi morreram em lados opostos daquele pequeno carro, como se estivessem tentando se afastar um do outro? Por que as autópsias não revelaram nada? A possibilidade de terem escapado uma arma genética poderia responder ao menos a terceira questão. Haveria uma ordem de silêncio.
Se ele avançasse com essa hipótese, poderia deduzir que não ter havido outras vítimas significava que o vírus não estava no ar. Ou se espalhava pelo sangue, como a AIDS, ou era pouco contagioso. Porém, o mais importante era saber onde eles haviam contraído isto. Ele teria que voltar e examinar minuciosamente todas as atividades que fizeram em agosto e setembro de novo e procurar por lugares e horários que tiveram em comum. Já que os participantes tiveram a boca fechada permanentemente, isso não seria fácil. Caso seu encontro tenha sido um segredo entre os quatro, algo que nem seus pais nem seus amigos soubessem, então como ele iria desenterrar isso? Mas ele estava certo de que estas quatro crianças tinham algum horário, algum lugar, alguma coisa em comum.
Sentando-se diante de seu processador de escrita, Asakawa perseguiu o vírus desconhecido de seus pensamentos. Ele precisava registrar as notas que acabou de fazer, para somar ao conteúdo da fita cassete que também havia feito. Ele tinha que terminar este artigo hoje. Amanhã, domingo, ele e sua esposa, Shizu, iriam visitar a irmã dela, Yoshimi Oishi. Ele queria ver com seus próprios olhos o lugar onde Tomoko havia morrido, para sentir em sua própria pele seja qual for o ar que ainda permeava. Sua esposa concordara em ir até Honmoku para consolar sua desolada irmã mais velha; ela não suspeitava da real intenção de seu marido.
Asakawa começou a bater nas teclas de seu processador antes que pensar em um esboço decente.

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